O grafite além da arte – uma ferramenta de aprendizagem

Pedro (o nome foi trocado a pedido do entrevistado) encontrou na pichação uma forma de expressar a insatisfação com o mundo ao seu redor, como acontece com a maioria das pessoas que praticam esse ato. “Pode-se dizer que os jovens envolvidos com a pichação lançam mão dessa prática como forma de demarcar suas identidades e confrontar a sociedade”, explica a psicóloga Juliett C. F Cavalcante.

“O grafite é muito mais que o estudo da arte”, fala o Mestre em Educação, Arte e História da Cultura, João Luís Machado

Um dia, Pedro foi pego pichando um patrimônio público. Como punição, foi obrigado a prestar serviço comunitário, pintando o muro de uma escola. Nesse momento, descobriu que poderia expressar seus sentimentos através de uma arte – o grafite.

Essa manifestação artística pode ser trabalhada de outra maneira que não apenas como medida educativa em Centrais de Penas Alternativas; ela também pode ser explorada em âmbito escolar. É o que defende o Mestre em Educação, Arte e História da Cultura, João Luís de Almeida Machado. “As escolas, muitas vezes, têm paredes ociosas, que acabam sendo pichadas interna e externamente. Criar um projeto de grafite daria a estas paredes e muros um significado, um sentido”, afirmou, ressaltando que é preciso explicar toda a parte teórica, como história, possibilidades e materiais, sem esquecer da composição inicial no papel. Desta forma, o grafite poderia até atingir outras disciplinas, como matemática e geografia. “O projeto poderia trabalhar, por exemplo, temas como ética e meio-ambiente, entre outros, o que colocaria na frente de ação também os professores de ciências e biologia e, associado a teatro, música, poesia e produção de vídeos, por exemplo, criaria uma grande ação cultural dentro da escola com repercussão positiva”.

Se antes era considerado como uma prática relacionada à marginalidade, João diz que hoje a escola entende que os tempos são outros, incorporando elementos que, no passado, seriam vistos com preconceito. “A expressão livre das ideias, com responsabilidade, é um caminho sem volta e, neste sentido, o grafite ganha vulto não apenas na educação, mas nas artes como um todo, em escala mundial. É um avanço que não podemos deixar de considerar, um grande ganho”.

O Mestre em Educação acredita que a inserção do grafite no universo escolar seria um incentivo para diminuir o número de futuros pichadores. “Estaríamos difundindo a ideia do grafite como uma forma de expressão artística que precisa ser valorizada e pode significar uma forma de comunicação com o mundo que é legal, tanto no aspecto jurídico, desde que respeitadas condições pré-estabelecidas, como realizar o grafite com autorização dos donos dos espaços modificados, quanto em tudo o que a arte por si só representa, elemento de manifestação, de expressão, de fala com o mundo”.

Educando o pichador com medidas alternativas

Apesar de ser um meio de punição, as medidas alternativas aplicadas a quem comete um ato ilegal – como a pichação – possuem caráter educativo. Muitas vezes, a ação se transforma na descoberta de um talento que estava escondido. “Bem aplicada e em cidades onde exista uma central de penas alternativas, a punição dá resultado positivo. Em São Bernardo, um garoto cumpriu pena em uma creche, fazendo grafites. Ao pintar o estabelecimento de ensino, usou sua criatividade para o bem e deixou todas as crianças, que acompanharam o trabalho dele de perto, muito felizes”, conta Niusa Maria dos Santos Rocha, Diretora Regional do Departamento de Penas Alternativas para São Paulo e Grande São Paulo, órgão ligado à Secretaria de Segurança Pública do Estado.

A psicóloga Juliett C. F. Cavalcante ressalva que mudar o comportamento do infrator apenas com a medida alternativa nem sempre é possível. Para o êxito total, ela deve estar aliada a outros elementos. “Acredito que a conscientização, no qual essa se dá através do sistema educacional e familiar, é a alternativa que, juntamente com a punição, pode trazer maiores resultados”.

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