Olhando hoje é difícil acreditar que um dia o rio Tietê fez a alegria de muita gente e era uma das opções preferidas de lazer para o fim de semana dos paulistanos. Mas era. Diversos documentos, como o depoimento do Patriarca da Independência, José Bonifácio, registrado em 1839, afirma que a beleza do rio estimulava os habitantes e passeios em suas margens eram bastante comuns.
Porém, a partir de 1940, o crescimento desordenado da Região Metropolitana de São Paulo provocou a poluição do rio Tietê.
Desde 1991, o rio tem sido palco das ações de mobilização da sociedade, quando a SOS Mata Atlântica em parceria com a Rádio Eldorado reuniu 1.200.000 assinaturas num abaixo-assinado entregue ao Governo do Estado de São Paulo. A coordenadora da Rede das Águas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, conversou com o Mais Notícias e contou mais sobre o projeto de despoluição do Tietê. Confira.
Mais Notícias – Desde 1991 a SOS Mata Atlântica tem uma grande atuação com a despoluição do rio monitorando a qualidade da água. Como surgiu essa iniciativa?
Malu Ribeiro – A partir da campanha em prol da despoluição do Tietê, iniciada por meio da parceria com a Rádio Eldorado, conseguimos dar início as ações de despoluição. Com essa pressão popular, as pessoas se mobilizaram e a despoluição do Tietê virou uma causa dos paulistas e de todos os brasileiros. Mas precisávamos de um instrumento que mantivesse os cidadãos mobilizados e que desse transparência ao projeto Tietê, que começou a ser executado pelo Governo de São Paulo e SABESP com recursos do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. O Núcleo União Pró-Tietê, criado em 1991 na SOS Mata Atlântica, era o catalisador da campanha e das ações de mobilização voltadas à recuperação do Tietê e buscou, junto a especialistas, uma metodologia que permitisse instrumentalizar os cidadãos para acompanhamento do Projeto Tietê e da qualidade da água dos rios e córregos da Região Metropolitana e das sub-bacias hidrográficas que formam o maior rio paulista. Assim nasceu o projeto Observando o Tietê, que utiliza metodologia de monitoramento da qualidade da água por percepção, desenvolvida pelos professores Samuel Murgel Branco e Aristides Almeida Rocha para a Fundação SOS Mata Atlântica. Essa metodologia, que completará 18 anos em 2011, vem sendo aperfeiçoada e utilizada pela Rede das Águas para acompanhamento dos indicadores de qualidade da água na bacia hidrográfica do Tietê como instrumento de controle social e monitoramento do Projeto de Despoluição desde o início. As coletas de água e análises são realizadas mensalmente por mais de 300 grupos, formados por cidadãos, que monitoram a água em diversas bacias hidrográficas, replicada em dez estados da Mata Atlântica.
Mais Notícias – Como é feito esse monitoramento?
Malu Ribeiro – O monitoramento é feito com um Kit de análise, desenvolvido pela Rede das Águas e que utiliza como indicadores 14 parâmetros físico-químicos, biológicos e de percepção, como temperatura, turbidez, espumas, lixo, odor, peixes, larvas, vermes brancos ou vermelhos, coliformes totais, oxigênio dissolvido, demanda bioquímica de oxigênio, potencial hidrogeniônico, nitrato e fosfato. Por meio de um sistema de dados disponibilizado na Internet e de logins e senhas, as coletas e índices obtidos com os reagentes do kit, é feita a classificação da qualidade da água, em cinco níveis: péssimo, ruim, aceitável, bom e ótimo. Esses parâmetros são compostos pelo Índice de Qualidade da Água (IQA), padrão definido no Brasil por Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
Mais Notícias – Ao longo do seu percurso, quais são os pontos mais críticos do rio Tietê?
Malu Ribeiro – Junto à foz dos córregos que recebem cargas de esgoto sem tratamento, provenientes das cidades de Mogi e Suzano, antes de chegar em São Paulo e de Guarulhos, já na cidade de São Paulo. A maior concentração de cargas poluidoras é na região do Cebolão, junto ao rio Pinheiros, onde os esgotos provenientes de todas as cidades da região metropolitana se concentram. Essa poluição afeta drasticamente a vida das pessoas que moram nas cidades de Santana de Parnaíba e Pirapora do Bom Jesus, onde o odor e a formação de espumas incomodam as populações.
Na medida em que o rio se afasta da região metropolitana surgem outros fatores e pontos críticos, como a foz dos rios Jundiaí, Capivari, Piracicaba, com esgotos provenientes dessas outras regiões metropolitanas de Campinas, Sorocaba, Jundiaí e Piracicaba e também outras cargas difusas como agrotóxicos, fertilizantes e adubos, ausência de matas ciliares e lixo. Tudo isso se concentra novamente no fundo dos reservatórios que fazem parte da hidrovia Tietê Paraná e do sistema de hidroelétricas do Tietê ao ponto de o reservatório de Barra Bonita ficar tomado por algas em determinadas épocas do ano.
Mais Notícias – O que a população ainda pode esperar do rio Tietê?
Malu Ribeiro – A sua recuperação, na medida em que avançamos nos índices de saneamento básico e tratamento de esgotos, como ocorreu em outros grandes rios da Europa, para usos múltiplos da água como transporte, irrigação, conforto paisagístico e climático, lazer, geração de energia e abastecimento público em algumas regiões, assim como a atividade pesqueira que é forte a partir de Anhembi.