“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”. Este texto, reprodução do parágrafo primeiro do artigo 19 da Constituição Federal do Brasil, estabelece o termo muito usado de que o Estado Brasileiro é laico, ou seja, não privilegia (ou torna oficial) qualquer religião, algo fundamentado pelo §7º do artigo 5º: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
Todavia, não é de hoje que a classe política tem privilegiado a religião evangélica (e a católica, anteriormente) em detrimento de outras. A explicação? Há votos. Pois bem, na eleição passada, não foram raros os apoiadores do então candidato a deputado Anderson Benevides que apostaram na chamada “força das igrejas” para conquistar votos. Seu tio, o prefeito Saulo Benevides, inclusive, foi um dos que apostaram nesta fórmula. Ainda assim, com pouco mais de 38 mil votos, foi apenas suplente. Ainda que superestimada, é uma fórmula que tem sido repetida com certa frequência. Não é raro vermos políticos de outras religiões – até mesmo das consideradas “banidas” por algumas igrejas – abraçando evangélicos em busca de “preciosos votos”.
Esta semana, em Ribeirão Pires, o Prefeito Saulo Benevides apresentou novos secretários que, por sinal eram evangélicos e, na cerimônia, levaram representantes de suas respectivas igrejas. Com isso, a chamada “bancada evangélica” na Prefeitura aumentou. Na mesma cerimônia, um dos assessores de segundo escalão do prefeito celebrou a casa cheia: “agora é a hora da virada, com as Igrejas do lado, Saulo não perde”. Outro, questionado informalmente pela nossa reportagem, afirmou que, de fato, trata-se de uma estratégia elaborada “para conter a baixa popularidade”. De fato ele conta, mesmo tendo a máquina em mãos, com pífia intenção de votos nas pesquisas realizadas até aqui – não chega a 10%, com rejeição (índice de pessoas que declaram não votar nele de jeito nenhum) de quase 60 %, segundo pesquisa recente do Diário do Grande ABC.
Fatos à mesa, resta o questionamento. A abertura do que, jocosamente, já está sendo chamado de “Paço Teocrático” seria uma oportunidade pela competência dos escolhidos (o que não está em discussão, cabe ressaltar) ou por uma tentativa desesperada de tentar amealhar apoios para tentar reverter uma situação que ainda patina?
Números – Um estudo recente, baseado no censo, aponta que cerca de 23% dos brasileiros é da religião evangélica. Dentre o eleitorado global do país, são 22% do total de votos. Em entrevista à revista Exame, Paul Freston, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e autor do livro “Igreja e Política, sim. Igreja e estado, não” (e evangélico), afirma que “na prática, os evangélicos não têm peso para decidir uma eleição majoritária, como para presidente ou governador”, uma vez que o apoio das igrejas, a despeito de compartilharem a orientação religiosa, tende a se pulverizar entre os diversos candidatos. “Numa eleição apertada, o favoritismo evangélico pode ser fiel na balança. Mas, numa eleição apertada, muita gente pode ser fiel na balança”, disse o professor, ressaltando que “Quem é membro de igreja também é outras coisas, a sua vida não se reduz às paredes da igreja”. Por fim, Em uma eleição proporcional (para deputado ou vereador), a situação muda: “uma igreja grande pode sozinha eleger um representante”.