Dedé da Folha, Saulo Benevides, Banha e Gerson Constantino. Em comum aos quatro está o fato de serem todos eles ex-presidentes da Câmara de Ribeirão Pires. Em comum aos quatro também existe um elo: a contratação do advogado João de Deus sem licitação ou concurso para a Câmara Municipal. Em comum aos quatro também existe o risco da perda de Direitos Políticos por improbidade administrativa.
O Ministério Público do Estado de São Paulo entrou com uma Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa contra o quarteto, que ocupou a presidência da Câmara Municipal entre os anos de 2002 e 2014. Coincidência ou não, os anos em que João de Deus foi contratado para Assessoria Jurídica Especializada.
De acordo com o documento, que veio a público após notícia publicada pelo Diário de Ribeirão Pires e ao qual a redação do Mais Notícias teve acesso, o advogado, que começou a carreira pública ainda nos anos 70 do século passado como vereador em Osasco foi contratado como comissionado em 2002, na gestão de Banha como presidente, como consultor jurídico e administrativo, sendo exonerado oito meses mais tarde, em 31 de março de 2003. Uma semana mais tarde, sem licitação, foi recontratado com objetivo de prestar “consultoria e assessoria na área financeira, orçamentária e patrimonial, bem como consultoria e assessoria jurídica e administrativa” por 21 meses, em contrato com valor de R$ 73 mil. Com o novo regime, ele ficou apto a prestar serviços em Osasco (onde já estava) e em Mauá. Este contrato foi aditado por mais 21 meses pelo mesmo Banha, sem reajuste, em dezembro de 2004.
O sucessor, Saulo Benevides, aditou o contrato e deu ao advogado mais atribuições: “Acompanhamento e defesa das contas do Legislativo Municipal referentes aos exercícios de 2005 e 2006, inclusive apartados, junto ao E. Tribunal de Contas do Estado de São Paulo; Assessoria, consultoria e assistência técnica legislativa à Mesa Diretora da Câmara Municipal, durante a realização das sessões ordinárias; Acompanhamento das prestações de contas dos senhores Vereadores referentes aos gastos realizados com suporte nos recursos disponibilizados a título de auxílio-encargos gerais de gabinete de vereador e Assessoria, consultoria e assistência técnica às Comissões da Câmara Municipal”, com valor bruto mensal de R$ 5.500. Saulo procedeu em novo aditamento, por 18 meses, ao valor de R$ 99 mil. Um detalhe: o ex-presidente e atual prefeito de Ribeirão Pires ignorou solenemente a possibilidade de caracterização do crime por empenhar despesa nos últimos dois quadrimestres do seu mandato como presidente.
Em 2008, foi a vez de Dedé da Folha repetir a atitude de seus antecessores e, também sem licitação, alegando “serviço técnico especializado”, recontratá-lo para “consultoria e assessoria jurídica e administrativa” por mais 24 meses a “módicos” R$ 165.600,00. Banha, que sucedeu Dedé, aditou o contrato em 2010 por outros 24 meses pelo valor de R$ 7.700 mensais (R$ 184.600 total). Gerson Constantino, em 2012, procedeu em novo aditamento, subindo os honorários mensais para R$ 8.525,44 (R$ 204.610,56 total).
Findo este contrato, em 2013, Banha mais uma vez recontratou João de Deus para “assessoria jurídica e consultiva junto ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, bem como nas Comissões Permanentes da Casa Legislativa e à Presidência e à Mesa Diretora” por 24 meses ao valor de R$ 220.800.
Apenas em 2015, depois de 12 anos de assessoria técnica especializada, o contrato foi rescindido pelo atual presidente, Zé Nelson, após apontamento de possíveis irregularidades.
Promotoria aponta irregularidades
Em seu documento, a promotora Graziela Borzani aponta que “restou suficientemente esclarecido que os primeiros acionados (na qualidade de Presidentes da Câmara Municipal local), sem a realização de qualquer concurso público e/ou de qualquer modalidade de licitação, contrataram diretamente, para a realização de toda e qualquer assessoria jurídica e administrativa da edilidade local, o advogado João de Deus Pereira Filho”, apontando que até mesmo tarefas corriqueiras, ou seja, que em tese não demandam atenção especializada, ficaram sob sua responsabilidade. “É fato que, para todo e qualquer trabalho jurídico referente à Edilidade de Ribeirão Pires, em especial para aqueles corriqueiros e de necessidade permanente, (João de Deus) era sempre chamado”, diz o texto, antes de ressaltar: “o que chama mais a atenção nisto tudo que se acabou de dizer é o fato de que, para o mesmo serviço, em quase 12 anos, somente um único advogado estaria hábil ao fiel desempenho do tal auxílio, tanto que sua contratação dispensou por mais de uma vez a realização de licitação”.
Desta feita, como o advogado prestou serviços de forma contínua e permanente, em questões rotineiras, está descaracterizado o caráter singular (único) que demandaria a contratação de um especialista. Com isso, faz-se necessária licitação – o que não ocorreu. A promotora ressalta que “mesmo sendo ele notoriamente especializado em direito público, não precisaria ser contratado porque as Assessoras Jurídicas e Administrativas da Casa Legislativa também devem possuir idênticos conhecimentos e até com mais razão, já que trabalham exclusivamente na Casa de Leis” e que, se não há procuradores aptos a realizar tal função seria “motivo para a abertura de concurso público do referido cargo e não a contratação direta”. Cabe ressaltar que nos 12 anos em exame não foi realizado qualquer concurso público para a contratação de um Procurador pela Câmara.
Desta forma, por improbidade administrativa (corrupção) e por violação ao princípio da moralidade e legalidade, bem como o princípio da impessoalidade, uma vez que “com a prática das nomeações aqui impugnadas, não apenas favoreceram os interesses políticos próprios e do advogado escolhido a dedo, mas, acima de tudo, prejudicaram o direito válido de advogados estudiosos e competentes de alcançarem, de modo impessoal, o posto de procurador e/ou consultor jurídico da Câmara Municipal com base em concurso público e/ou licitação”, é solicitado que Dedé da Folha, Saulo Benevides, Banha e Gerson Constantino sejam condenados por improbidade administrativa com consequente suspensão dos direitos políticos, perda da função pública que eventualmente estejam exercendo no momento do trânsito em julgado da condenação, multa e a proibição de contratar, receber incentivos ou pagamentos do poder público.