Uma das promessas de Ano-Novo mais comuns é perder peso e uma receita, de nome um tanto esquisito, tem sido amplamente divulgada como benéfica à saúde e grande aliada na luta contra a balança, já que dá a sensação de saciedade, reduzindo o apetite: a ração humana. Trata-se de um composto nutritivo de cereais, farináceos e sementes, que, triturados, viram um pó que pode ser misturado ao leite ou suco. A mistura foi desenvolvida pela terapeuta natural Lica Takagui Dias, com o aval do nutricionista Daniel Boarim. Inicialmente para consumo próprio da especialista, que desejava uma alimentação que fosse nutritiva para a sua gravidez, não engordasse e a mantivesse em forma a pele, os cabelos, as unhas e, principalmente, o funcionamento do intestino. Logo ela passou a revender aos amigos, vizinhos e outras grávidas com quem tinha contato e o mix transformou-se em uma marca comercializada em cerca de 500 pontos de venda no país.
Lica diz que o nome “ração humana” surgiu porque começaram a comparar com a ração dos animais, já que ambas trazem nutrientes que melhoram a saúde. O nutrólogo e vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), José Alves Lara Neto, não concorda com a nomenclatura dada. “A palavra ração humana está errada, porque ela é um complemento de outro alimento. A ração que nós damos aos animais é diferente, porque eles comem aquela ração e estão suplantados com as suas necessidades alimentares. A ração humana não, ela pega alguns alimentos reconhecidamente bons como complemento na nossa nutrição diária”, fala.
Existam diversos tipos de rações humanas. Elas podem ser encontradas em lojas de produtos naturais, mas qualquer pessoa pode criar seu próprio composto, sendo que alguns ingredientes são recorrentes em diferentes versões: São eles:
Aveia – Envolve as moléculas gordurosas, dificultando sua absorção pelo organismo. Por isso, ajuda a diminuir o LDL, o colesterol “ruim”. Rica em vitamina B, proteínas, ferro, cálcio e carboidratos, atuando na formação dos ossos e do sangue.
Açúcar mascavo – Adoçante natural rico em cálcio, ferro, potássio, vitaminas e sais minerais, é ótimo substituto ao açúcar refinado, que passa por processo químico e perde seus nutrientes.
Cacau – Contém minerais e é fonte de energia e estimulante na produção de serotonina, o hormônio do bem-estar e do bom humor.
Fibra de trigo – A película externa da parte comestível do grão de trigo não passa por processos de beneficiamento. Por isso, mantém os seus nutrientes e vitaminas essenciais ao funcionamento do metabolismo. Rico em proteínas, fibras e ferro.
Gergelim – Aumenta a atividade cerebral, restaura a vitalidade, a capacidade sexual e ameniza os efeitos de sobrecarga física.
Guaraná – Contém cafeína e por isso é boa fonte de energia. Também conhecido pelo seu efeito afrodisíaco.
Levedo de cerveja – Acelera a atividade física e mental. Contém sais minerais e vitaminas, fortalecendo o sistema imunológico. Rico em vitaminas do complexo B, manganês, cromo e fósforo.
Semente de linhaça – Rica em ácidos graxos, ômega 3, ômega 6, proteínas, sais minerais, vitaminas e aminoácidos essenciais. Ameniza os sintomas da TPM.
Quinua – Possui um balanço de 20 aminoácidos. Seu valor nutritivo é comparável ao leite materno.
O nutrólogo faz algumas ressalvas sobre os itens. “O açúcar mascavo pode ser um bom substituto para o açúcar refinado, porém, é uma coisa calórica que mexe com a insulina. O cacau contêm minerais, é fonte de energia, mas ele é altamente calórico. A linhaça tem ômega 3, 6, proteína, mas também tem uma grande quantidade calórica, é um óleo.
Para um diabético, por exemplo, o problema dele não é só comer açúcar, é comer calorias. Se a caloria se exceder com a complementação alimentar que ele vai fazer, ele vai pagar um preço mais alto. Uma pessoa que tenha problemas de intestino pode ter problema com as fibras”, destaca ele, que completa: “As fibras dão saciedade, para quem quer emagrecer é uma beleza, mas você tem isso em uma laranja que você mastiga também, em uma maçã, quer dizer, não necessariamente você precisa fazer aquele pó (ração humana)”.
Na ânsia de emagrecer, muitos substituem a refeição pela mistura desses ingredientes em um copo de leite ou suco. A ação é totalmente condenável por Neto. “Substituir uma refeição por isso é aberrante. Perdeu-se o conceito natural da dieta que é a responsabilidade pela nutrição, fornecendo energia e elementos para a construção plástica do corpo, evitando as doenças. (A ração humana) é boa junto com uma dieta normal, com arroz, feijão… Se a preocupação da pessoa é uma suplementação de alguns nutrientes, a pessoa que tem um colesterol alto, que quer usar mais fibras porque tem problema de constipação intestinal, é muito válido que ela use, mas junto com outra alimentação. Se ela (a pessoa) perder a noção da importância que tem a manutenção da alimentação culturalmente estabelecida para cada povo, cada região, ela vai ficar doente, com toda certeza”, finaliza.