Os muros da cidadania e a vergonha alheia

Quanto mais o tempo passa, mais o polêmico “Muro da Vergonha” que cerca a Rua Domingos Mejias Morgado se torna uma daquelas mal contadas histórias que cedo ou tarde acabará entrando para o anedotário de piadas de péssimo gosto da cidade.

Para os poucos que não se lembram, o local popularmente chamado de “Estacionamento 45°” era um bem público, rua que fazia parte do estacionamento rotativo (a Zona Azul) e servia à população e ao comércio local muito bem, além de ter sido palco de vários eventos da cidade desde comícios até shows de bandas renomadas como o Ira!, que lá esteve por algumas vezes. Mesmo sendo alvo de queixas por conta do público que o frequentava a noite, não era nada tão grave que não pudesse ser resolvido com intensificação da segurança.

Em 2010, em um daqueles contos fantásticos dignos de Edgar Allan Poe, a rua foi vendida para um particular, no caso a empresa Lara, a mesma que faz a coleta de lixo da cidade e deixou de ser patrimônio público. Hoje, o local está murado e, ao contrário das promessas da época, tornou-se – pasmem! – um estacionamento, desta vez privado, deixando como legado duas passagens de servidão que hoje são problemas de segurança pública bem maiores que os anteriores.

Uma moradora que chegou a cidade recentemente, ao tomar conhecimento da história, a ironizou e lembrou de outros “muros da vergonha” similares, as malfadadas guaritas que tomaram conta da cidade e restringem – ainda que de forma moderada – a liberdade de ir e vir do cidadão. Uma delas fica na Rua José Pinto Novaes Junior. Certa vez, um munícipe relatou que quis subir com seu filho para visitar o chamado “Bosque Florestal” (a famosa “caixa d’água”) que há no final da rua e foi impedido por um guarda, o que é inclusive proibido pela lei que as regula, a 4250/99. Vale lembrar que estamos nos referindo a uma via pública, não a um prédio particular e murado.

Mais irregular ainda é a grade instalada em frente ao Mirante São José para impedir a passagem de visitantes pela parte interna do Jardim Panorama. Não é exagero dizer que, por fechar o caminho mais curto, é culpada por boa parte do abandono do principal ponto turístico de Ribeirão Pires. Mais uma vez, está sendo fechada uma via pública infringindo a legislação.

Há muitos outros exemplos de desrespeito a cidadania que poderíamos citar e que no fundo deságuam na foz do mesmo rio: o da falta de respeito com o próximo, o de partir do princípio de que todas as pessoas não são de bem. Ora, se queremos ser uma “Estância Turística”, o primeiro passo é acolher aos visitantes, não utilizar justificativas vazias sob o mote de uma pretensa sensação de segurança. A mesma moradora que os citou, aliás, ironizou falando que “alguns pensam morar em Rodeo Drive”, famoso ponto turístico de Beverly Hills, na Califórnia. A comparação, mesmo exagerada, toca em uma grave ferida aberta que ainda deve ser cicatrizada já que estamos em uma cidade que ainda carece do básico: respeito ao próximo e cidadania.

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