A meia-entrada não existe

Uma pesquisa divulgada na última segunda retomou a discussão sobre o verdadeiro valor da lei da meia-entrada para estudantes e idosos. Realizado pelo instituto Datafolha no último dia 3 de maio, o levantamento aponta que 96% dos paulistanos são favoráveis ao benefício para idosos e 91% para estudantes ao mesmo tempo em que 68% dos entrevistados pensam que o valor dos ingressos para as atividades esportivas e culturais – os alvos da lei – estão caros ou muito caros.

A discussão se dá justamente por conta deste último fator. Questionados, todos os produtores culturais atribuem os altos valores à meia-entrada, obrigatória e irrestrita para todos os dela possam usufruir, no caso estudantes e maiores de 60 anos e, para “compensá-la”, já que é preciso garantir um mínimo valor médio por espectador, a solução encontrada foi justamente a que anula os efeitos da lei: dobrar o preço.

Supondo que para o show de uma banda X, o preço de custo para o produtor seja de R$ 20 mil. Se dividirmos esse valor por 2.500 pessoas, a capacidade de uma casa de shows normal, teríamos um custo de R$ 8 por espectador. Desta forma, pelos padrões de mercado, esse ingresso teria que ser vendido por ao menos R$ 40 (o chamado ticket médio) para se obter uma renda de R$ 100 mil. Considerando que em shows musicais o índice de estudantes (verdadeiros ou falsos) chegue a 95%, se a meia-entrada fosse cobrada pelo preço que citamos, a renda obtida seria de R$ 52.500, ou seja, 52,5% da renda original sem a sua cobrança.

Por isso, é praticado, como disse o ator Odilon Wagner, presidente da Associação de Produtores Teatrais Independentes, um “preço falso” que, via de regra, é o dobro do valor que deveria custar. Reutilizando o exemplo já dado, o ingresso seria comercializado a R$ 80, valor que compensa a perda de recursos causada pela meia-entrada e sacrifica a minoria que não a utiliza por não fazer jus ao direito ou não querer usar meios escusos, como a falsificação de carteirinhas.

Desta maneira, é seguro dizer que a meia-entrada não existe e, além de ser um estorvo para o produtor cultural, ainda afasta aqueles que porventura queiram frequentar eventos culturais e não sejam beneficiados pela lei. Da mesma forma, não está longe da verdade a afirmação de que o benefício é mero instrumento político usado pelas entidades estudantis, longe de ser que uma forma real de se democratizar a cultura e o lazer, um crime contra a economia popular disfarçado.

Não é surpresa portanto, que novas leis estejam tramitando no Congresso a respeito do tema. Uma delas devolve às entidades estudantis como a UNE e UBES e aos Diretórios Acadêmicos a exclusividade para a emissão das carteirinhas que garantem a meia-entrada. Outra restringe o direito a estudantes, idosos, deficientes e jovens com renda até dois salários mínimos inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal e limita a quota de meia entrada a 40% dos ingressos disponíveis – ainda que a boa fé dos bilheteiros em cumprir a medida seja questionável.

Fato é que é preciso uma mudança urgente na legislação que, ultrapassada, faz com que seja criado um círculo vicioso que em seu final serve apenas para restringir o acesso à cultura e colaborar para que nosso povo seja menos culto.

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